quinta-feira, 1 de março de 2012

males que vêm por bem

todos temos na nossa vida momentos em que uma intempérie quebra o ritmo, a rotina. Que nos faz sentar e pensar "e agora?". Geralmente são as más noticias, as pedras no caminho. A ingratidão da vida é inevitável. E custa sempre mais quando nos toca à porta. Tocou. De mansinho, mas tocou. Imaginem alguém, que não sendo familiar directo, é ainda assim uma das pessoas mais importantes que a vossa vida conheceu. Pesa ainda mais. Falo-vos de um "avô", que não sendo de sangue, é do mais afectuoso que se possa imaginar. Falo de quem me criou. De quem nos levava, a mim e à mana ainda pequenitas, para a fazenda e nos deixava em cima de uma saca enquanto se apanhavam limões e outros que tais. Que nos deixavam palmilhar terra, frutas e animais e nos proporcionaram uma infância a que eu gosto de chamar, não só rural, mas muito saudável. De quem em miúda, me contava histórias e anedotas na cama para superar os meus medos de dormir fora de casa, as minhas noites de pesadelos suados que me impediam de sair para uma pernoita, mesmo que a mudança fosse, neste caso, só para o andar de cima. De quem me fazia carrinhos de rolamentos e me deixava molhar os braços até ao pescoço à procura de peixes no tanque grande. De quem foi sempre a minha companhia de eleição para noites de serão à varanda nas noites quentes, de tantas datas festivas e passagens de ano onde os meus pais eram facilmente dispensados para me poder escapar para a casa deles... Falo de quem se emocionou, de quem chorou assim que saí da sala, por me ver de saída para o meu primeiro baile de finalistas. De quem me recebe sempre como se não me visse há anos, desde que deixámos de ser inquilinos e nos mudámos para a rua de cima - com beijos, abraços e amassos sempre tão expressivos. De quem se orgulhou de todos os passos importantes que dei. De quem se enterneceu por me ver fardada, pelo emprego que conquistei, pela vida que fui e vou construindo. Pessoas que, não sendo de sangue, são por nós amadas incondicionalmente. De tal forma que me recordo ainda hoje dos ciúmes que a minha avó tinha, e que por certa forma até a minha mãe tem deles... De uma forma não prejudicial, claro.

Isto tudo para fazer perceber a dimensão que uma má noticia pode ter quando alguém nos é tão querido. Ao saber, sem agenda, que ao fim de 77 anos de plena saúde, uma pneumonia de cura simples, se prolongou para um diagnóstico de bicho mau, ruím, que entre testes e exames foi descoberto ainda em fase inicial. E assim comecei, assim termino: há males que vêm por bem. Não fosse uma tosse que teimava em não passar e o bicho ia pulando e avançando até ser sintomático. Alguém permitiu que assim não fosse. E por isso, tem toda a minha gratidão. E com ela toda a esperança de que passe depressa, que o mal se corte pela raíz e deixe que tudo volte ao que sempre foi até agora.

Ju*

1 comentário:

Anónimo disse...

A mana mais velha ainda acrescentava aí mais umas coisas: comer terra sentada em cima de um monte de "esterco", andar a cavalo na Nóia (a serra da estrela que andava a tomar conta de nós), tomar banhos de piscina num tanque que ele enchia só para nós, andar atrás de um porco que teimou em fugir na hora errada, adormecer no meio deles debaixo de um cobertor elétrico......e tantas outras coisas felizes e inesquecíveis.

Correu tudo bem e ainda o teremos por muitos e longos anos;))

Bjs, mãe